terça-feira, 15 de julho de 2008

9:00 am.

Engraçado como o dia tava frio, relativo sol, e frio. As juntas já amanheceram doendo por aquele podre infeliz, uísque, lolitas e uma dosagem de sono perdido poderiam levá-lo ao médico diariamente para um tratamento intensivo. O anonimato, a nicotina, o álcool e todos aqueles meses de insônia perdidos, já eram por si só mais do que uns meros motivos para lidar consigo, de modo que a terapia de controle de raiva fora muito bem aplicada pelo meritíssimo. Por um lado, ele vivia a vida gritando, urrando, recebendo alguns afagos nos cabelos e dosando alguns pequenos problemas como qualquer mortal. Vivia em um apartamento nos arredores do centro da cidade, e não via muitos motivos para deixar de ser punk, ou mod, ou rock, ou quem sabe modfucker. O tempo já tinha roubado algumas bobas alegrias e delegado competência a outras. A terapia era necessária.

O consultório situado em uma avenida movimentada na parte sul da cidade, na verdade uma casa, que poderia ser o abrigo de qualquer bem abastado sujeito daquele antro de baratas, dizem que no calor elas caminham mais rápido! Bom aqui isso era testado e aprovado. A casa era velha por definição, mas como diria suas avós, nobres de coração, "Grande merda!", ele sempre pensava, de modo que chegou seu dia de visita, quase um tormento penitenciário, quase uma ancora nas rodas de um opala 73. Hoje particularmente vazio, não saberia dizer se dado ao horário ou dado ao fracasso de dignidade de sua terapeuta. Claro, boas pessoas tendem a cometer erros de dignidade, isso é um fato, de maneira a preservar os bons costumes ele ainda a tinha como amiga, factualmente era, intelectualmente era, pessoalmente também, mas somente pelas receitas de drogas ele ainda visitava a terapia.

As 9:00 am era sua consulta, e chegara as 9:45 am. Irritado, um frio, certo que a sensação térmica não poderia passar de alguns míseros 20 graus, e por definição nada congelante. Infelizmente ou felizmente esse ser é dado à culturas infundadas, praticas forenses impraticáveis e varias e varias cansativas, ou não, viagens ao cerne de seu universo. Entrou ao consultório e foi logo dizendo de maneira agitada e pouco hostil:

- Pode tirar as mãos do bolso e assinar a receita, eu mesmo vou preenchendo no caminho da farmácia!

- João. Não posso, mesmo sendo sua amiga, deixar você se drogar assim. Você sabe que as coisas não funcionam assim.

Claro que sabia. Claro que fazia aquilo apenas pra irritá-la, assim como se auto-convidava sempre pra quebrar os joelhos dos desafetos dela.

- Ok. Eu vou me sentar e você preenche mais rápido senão vou perder a hora.

-Perder a hora de que? De mofar em casa mais uma vez? João você já passou por isso outras vezes, e bem sabe que não é a melhor coisa a se pensar. - A tranqüilidade dela nunca foi uma virtude, era mais para ironia mesmo.

- Certo, certo, atire no cachorro morto. É mais fácil assim! - Sorriu e sacou um cigarro do seu bolso no peito, acendeu, e prosseguiu: - Sério querida, me passa aquele remédio bom para dormir, ando dormindo mal. Muito mau.

- João você dorme mal desde que eu te conheço, não vão ser os remédios que vão te dar sono. Por que você não procura uma amante? - Que sorriso maldoso, seria mais fácil não ter dito aquilo.

- Ah claro, você bem sabe que ao contrário de você, eu sempre preferi Strippers, seios maiores, mais bem treinadas, e o mais importante, pagamos pra não passarem a noite conosco. Quer um Go Go boy?

As risadas já estavam bem altas, de modo que a atendente ligou perguntando se tudo estava bem, respondendo que tudo estava nos conformes ainda pediu à pobre que trouxesse dois cafés amargos. Aquela situação era mais normal do que pudesse parecer, é algo que eu sempre penso nunca se trate com amigos, àquele infeliz nunca me ouviu.

- Olha o café ta chegando, então me dá um cigarro porque os meus já eram João. Hoje acordei tão atrasada que não consegui nem comprar um maço.

- Te dou o cigarro se você me der de presente a sua secretária. - O machismo e a peculiaridade com que contava fácil, o numero de risadas era de maneira impressionante. - Ela parece ser simpática.

- Até te daria ela, mas antes alguém tem que combinar com ela né? - Como aquela peste ria. - João falando sério, você sabe que eu sou péssima como cupido. Sou melhor terapeuta.

- Ah sim, só não de si mesma né. A julgar pelos teus últimos casos você ta pior que eu.

- Você bebeu? - Com um ar de escândalo, confuso com o natural ar de cinismo.

- Não mais do que costumo beber de manha. Hoje tá frio né?

- Frio? Desde quando? Queria mesmo era me mudar, quem sabe assim eu pudesse sentir frio. Sabe andei pensando que me mudar talvez fizesse bem a mim, talvez eu conseguisse me livrar desses demônios de ex-rolos que tenho.

Levantou-se, e buscou a janela, fitou-a com os olhos e lhe respondeu.

- Já lhe disse mais de uma vez, você só se interessa por tipo estranhos de homens. Como quer uma relação se ainda está presa nos teus velhos delitos amorosos?

- Ei quem tem que te avaliar aqui sou eu, lembra?

- Ah claro, só por que uma safada me condenou por jogar uma garrafa em um cara não faz de mim um criminoso faz? Vai saber né, sou perigoso, ou altamente volátil. - Acendera outro cigarro e sentara, o café chegou amargo como sempre.

- Não que isso, você é um doce de pessoa João, é tão inseguro e tão bonzinho quanto uma menininha de 18 anos. Faz me rir!

- É pra te fazer rir, ou pra te arranjar um namorado? Ainda não entendi, falta da cafeína sabe.

As risadas e bons tratos corriam soltos com a imagem do xadrez emoldurado na parede do consultório, poderiam ficar ali, horas e mais horas, dias e dias, conversas que não cessam fácil são sempre difíceis de se acabar, e amizades tão perversas, diabólicas e venenosas quanto aquela muito agradáveis pra se parar de uma vez. Ela assinou sua receita, e lhe deu em mãos, um beijo na face, e quando ele estava saindo ela proferiu suas ultimas palavras:

- Ei, João! Bom dia faz bem quando dito no inicio de uma conversa viu!

Um comentário:

Érica disse...

o mais prazeroso é sempre imaginar as pessoas que inspiram nossas conversas a lerem esses devaneios

;D

não deixamos passar nada...retrucamos demais nos fim das contas