segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Maria e João


Flor, você pode me acender um cigarro?
Flor, enquanto eu rezo você absolve meu pecado?
Flor, minhas lagrimas gritam por todos os lados!

João, pode reler o mesmo livro outra vez?
João, será que eu deixo mais recados sobre a mesa?
João, como posso gostar de olhar se ainda sou cega?

João, tem um vestido de gala,
Pra mim?
Flor, será que essas costas são largas demais,
Pra mim?

Flor, como seu velho bebê e chora!
Todas as vezes que caio e escuto
Que meu vicio mata!
Flor, há alguma droga que eu possa usar em paz,
Que acalme meu corpo?
João, quantas notas você ira tocar,
Enquanto eu durmo?

Mãe, por que deixar seus garotinhos distantes?
Se nossa febre arde como dois espinhos!
Mãe, por que resistir se todos temem você?



Imagem: Mark Ryden

Monólogo entre O Demonio e o Deus.


Novamente estava cheio de suas visões, usava dos gritos de seu silêncio a lança para combater o frio na espinha, do carpete vermelho até as pequenas demonstrações de afeto. Algumas vezes deixava florescer dentro de si uma pequena cavalgada, mas um tiro no asfalto, mas uma garrafa terminada e assim resumiam suas virtudes? Esse que nunca foi teu forte. Nesse nosso pequeno emaranhado de fitas adesivas anti-tabaco, nessa clínica de reabilitação constante, sentimos a falta da nostalgia balsâmica, da reação imoral e atemporal de se reescrever uma velha ferida, durante os anos e as modas, os verões e outonos, do francês ao inglês dos cabelos de Brigitte Bardot, ate as frívolas imaginações de Piaf, maldito seja o vicio, maldito seja a falta do vicio, e assim pensou.

- Deus não sabe o que me vale se eu calar sua voz! - Imaginando-se sozinho, ao calor de um corpo, aos foros unânimes de seu juízo. Prosseguiu. - Deus, não me espera entender um milagre apenas apagando a luz? Eu que sou apenas teu fardo, eu que volto ao negro, ao teu tubo negro, teu scarpin que não senti, tal qual o tatame ligava você a mim, que nem mesmos os sushis de sua existência responderiam com sua extra textura.

Tuas questões iluminavam teu coração, e os clichês de suas posições acariciavam tão facilmente seu peito que um enfarte não seria novidade, seguiu apenas comentando, as mãos na cabeça e a dor muscular de se deitar.

- Eu não voltarei ao tumulo que sai, não seria tão dramático assim, já estou aqui, falando contigo, pedindo, e isso não é natural. A contradição imposta em minhas frases, e os berros soltos à sua face remontam a imagem e semelhança do Cristo, tu que jamais me apoiou, e entrou em mim como uma farpa, enquanto a harpa tocava tuas canções celestiais, enquanto o asco vermelho dizia ser azul, e frasco de vitaminas já não me bastava, ao exílio e ao consumo, que tu me guiaste, hoje eu sigo cada dia atormentado, uma leve lembrança do passado, e um piano maldito ao inferno, que se danem os adjetivos, que se reclame de volta o profeta, quando a Cabala diz, e meus astros regem, você pra longe, distante, teu olhar cada dia mais penetrante, fotos apenas fotos.

Deitou e acalentou-se com o céu, os olhos fechados, os dedos fechados em suas mãos e a leve impressão de que já era tarde.

- Alguma composição interpretada por Piaf seria menos melancólica? Algum dia você enxergaria fora os edemas em minhas costelas? Que adão fez um péssimo trabalho já sabemos, que um deveria ser dois não consigo compreender, mas me faz reler a síndrome Peter Pan, me faz enlouquecer e buscar o caminho de olhar sempre pra trás com saudade.






quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

My Funny Valentine


Os dedos caminhavam lentamente sobre as curvas bélicas, as calcinhas comestíveis de zebra convidavam apenas um individuo, aqui tudo era como uma doença, uma luz vermelha, o negro e o cinza e acalentando a dor, a morfina. O tapete de feltro, as guias da escada, o som das risadas vindas do corredor atarantavam esse senhor. Meio quilo de carne e ossos dispostos uniformemente entre a jugular e a pélvis. Todavia estava lá, este senhor, aquela senhora, a inebriante mistura de pó com calcanhares, as teclas ressonantes do piano e as paredes fulminantes como Nápoles. Todas as citações cobertas de enguias, Cowboys punks, princesinhas egípcias, 2000 quilômetros para o inferno e o calor nunca foi tão convidativo. O café esfriando sobre a mesa enquanto o tórax abocanhava seu destino, lá estavam as dores e as camélias, as pequenas frustrações e as miseras ilusões, todos nós percebíamos o foco, mas a humanidade com seus rituais de magia cristã abominavam toda e qualquer perversão, as vezes se sorria, as vezes se mordia, um sax alto, uma trombeta, poucas e boas alegrias.

My Funny Valentine à esquerda, o aroma e a cúpula distantes dos gases Sarin, das forcas e de quaisquer sensações psíquicas. Normativas, artísticos, criativos, dois corpos efervescestes, ante braços entrelaçados, e uma placa de Cuidado, Perigo. O período fértil de um óvulo vazio. Nosso velho bolero, nossa antiga quermesse, a vida monástica abandonada pelo dinamismos da ardência juvenil. My Funny Valentine, de olhar distinto, frescores e distúrbios hormonais, a Rússia logo aqui, o México em seguida, um segundo traçado como uma vida. Os desatinos variados entre as partes já lascadas dessas peles, o couro irritado, o misto de satisfação e agonia, o êxtase, o tremor arredio de uma perna, a insalubridade dos desejos e sabores. Assim tocou a ultima sinfonia, ate o próximo movimento, até o armazém puxar da linha férrea um adjetivo melhor, um cadeado mais frouxo à um coração mais novo.

Todas as chaves, e brochinhos, todos os tubinhos negros com um jazzista ofensivo. Cada sentido estava apurado, um truque hormonal, um castigo. Uma datilografia, e todos os códigos Morse, a respiração ao pé do ouvido como o arrepio e a forca, estampidos, dividas e forças, uma luta cruel entre o querido e a querida, desprovidos de contato, aquecidos e arquétipos de Fausto, um enfarte e nada mais.