segunda-feira, 13 de abril de 2009

Fique Com Ela.


Hollywood Filters, definitivamente são o pior gosto que se pode tirar da boca! Assim desperdiçando meu tempo, amassando meu dinheiro entre suas coxas e roçando minha dignidade dentro dos teus roteiros frágeis e rotineiros, qualquer idiota social poderia apanhar meus segundos e doar para a caridade, sem medo do clichê e senso comum que abate teus fixos olhos. Ah, o negro dentro do cinza, o branco por compor, e as tiras vermelhas rodeando a insônia que trazia o conforto do lar. Estava eu tão ansioso por voltar na noite seguinte e roçar mais uma vez meus centavos nas coxas dela, que a gastrite novamente teria de ser o tom da graça, tiros revolveres e pistolas por todo lado. Queime a si mesmo e continue em brasas. Teoricamente algo fácil de fazer dentro daquele quarto escuro, com chão vermelho, cama mal arrumada de outros e outros hits de clientela, mal podia se tatear entre os seios, mal podia mirar com gosto meu anseio!


Como as Filipinas rendendo graças a Muhamed, as bruxas ardendo nas fogueiras e meus calcanhares desprovidos de munição foram apenas mais uma cruel brincadeira do tempo para extinguir a separação, de modo que o radio continuava tocando a nossa canção, mais um clichê, menos uma emoção. Os lábios vermelhos tateando meu corpo, os beijos e caricias tonteando meu centro gravitacional, que cheiro, uma pocilga com um aroma de classe, vodka e tequila com ar de qualidade barata e um doce sentimento infanto-juvenil de estar próximo a mãe. Madre santa, cassino e outras lembranças que o tempo rasgará. É minha irmã, o tempo se veste rápido.

Mesmo solitária ela estava comigo, e mesmo queimando como gasolina, poderia orar uma prece, de modo que eu pouco fodia para isso, como diria o mártir. As garras compunham o serviço bem feito. Deus como eu poderia casar com essa mulher, levá-la ao altar e depois estourar teus lindos olhos num ápice de gozo e discórdia. Claro que isso me faria futuramente arremessar teus miolos pela janela, e sentir no cheiro, o gosto da carne, de modo que ela postergaria teu epitáfio e atiraria gotas na minha face, mas eu nem ligaria. Mulheres de biquínis e metralhadoras sempre foram sexuais.


A maneira como ela atirava seu sexo na minha face desprovida de naturalidade, e a imposição dos tremores financeiros fariam do mercado financeiro apenas um pontapé inicial para uma crise sem precedentes, mas nós estaríamos ainda em chamas, quentes envoltos e lençóis e radiantes pelo momento, de fato diferentemente radiantes, eu pelo tempo perdido, ela pelo dinheiro ganho. Mas não é que seriam todas assim? Mesmo dizendo não dizem sim, e dizendo sim quem se importa com o resto. Sairia as quatro, e só voltaria na semana seguinte, de maneira que jamais largaria aquele cômodo artifício.

Ultimo cigarro da noite, o tempo se foi, como bem queria o senhorio. Através das frestas da porta do banheiro sentia ela esvaecer de um tempo técnico, a noite ainda aturaria mais maltratados para seu berço. E de nada adiantaria teus cabelos doces seu ar de suposta proteção, e a calmaria para abater a sensibilidade de uma mãe que apenas gostaria de fornecer o pão a tão pobres meninos. Santa Madre. Religiosamente Santa Madre.

domingo, 15 de março de 2009

Tomorow Never Knows!


Um imbecil, de rosto quente, pele alva, cigarro na boca, terno no corpo, cabelos curtos e vozes no ouvido. O carro não passaria de cento e vinte por hora, as luzes não iriam iluminar seu horizonte, faróis apagados, entre o sacolejar da pista, de modo alguém seria um dia perfeito, o que provavelmente não diria ser um dia imperfeito. Normal, atribuído ao teu peito, gritando nos ecos de seu silencio, qualquer fogo que viesse seria de seus pulmões, toda e único brilho seria da lataria envolta sobre si. Vinho tinto e confusões, uísque e nicotina, cocaína e codeína, chegara a hora do rock horror show. Passaste uma borracha no passado, guia-se sobre as novas e turvas fontes do prazer, onde o dinheiro rola solto e o riso frouxo, de maneira alguma seria apenas mais uma brincadeira. Não, agora é sério. É quase pai de família, quase um demônio vestido de demente, quase um famoso ilustre desconhecido.

Seis da manha João! Eis me aqui senhor Gilberto, pronto pra mais uma cria de diversão. Sexo, trapaças e terrenos, quantos terrenos. Apresse-se, o tempo é curto para conquistar tudo que você agora teme que idealizou. Mova o passo, largue a arma ou eu mesmo atiro em você! Acompanhante barato de columbinas, prostitutas e donas de casa. Não é que você não vale um centavo gasto! É João teu uísque já está cheio de água e resta encher mais o copo, pasme você não é assim tão incompetente quanto vê, de modo que não sou eu a falar com você, mas você a irritar minha garganta com o monossílabos durante a manha. É segunda feira e você se demorou demais pra chegar, transito de merda, cidade de merda, maldito corre-corre dos diabos!

O saxofonista tocou a primeira nota e no embalo de curvas fechadas, pessoas estranhas e mulheres desdentadas você ira sacolejar no ônibus. Dane-se, quem mandou ser quem foi! Hippie, punk, maldito, e agourado, agora se intitula o conselheiro. Belo conselho, ande logo, desça pelas escadas e corra, mas sem demonstrar a presa que aquece teus intestinos, avante HOMEM! Nem mesmo um cigarro vai te acalmar depois que entrar lá, de modo que um por todos e todos por um só se for ao seu patrão! Educado, dê teu tempero ao dia dos outros, tome a mão o café encha o copo pra não ter que voltar, pare de analisar os outros você não pode querer tanto assim! Bem verdade, você quer, teu sangue pede por isso, como um satélite que guia algum radar. Faça tuas ligações em silencio, que agora é a hora do show! Denovo.Cedo ou tarde, você terá de convencer alguém, que ele compre teu rosto em prol dos arranha-céus, que ele dê um soco, após descobrir teu talento natural. Não se preocupe que você revidará e agora se concentre, outros estão correndo no páreo e bem a frente. Pressionado meu caro? Tem a audácia de dizer isso? Claro você corre como um louco, mas ainda padece de experiência, certo, dizem que é tudo ao seu tempo. Pena que você não tem um, não é? Engula o café quente que é pra torrar teus sentimentos estomacais, e se preciso for, trate de negociar um vortex cerebral novo, não é bem esse o nosso ponto! Corra para engolir, volte a tempo da reunião, e se mande rápido. Desligue a porra do interruptor antes, e como sempre pode ser que você aprenda algo novo. Tomorow Never Knows!

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Noites de Cabíria (Parte IV)

O som do trompete não poderia competir com suas risadas a cada curva. Entusiasmada como uma adolescente em sua primeira noite, talvez menos insegura, essa parte cabia a mim, que absurdamente velho, me via como um desempregado na fila do serviço social. Sim a geração perdida abria espaço agora apenas paras as notas do jazz, e mesmo que um imbecil qualquer pronunciasse em sua lapide, “Aqui jaz alguém que não gostava de Jazz”, o mundo trataria de explicar-lhe a dinâmica do tempo, de modo que cada vez menos eu teria motivos pra sentir-me isolado, muito embora também não me permitisse sentir confortável em furtos.

Qualquer esquina dobrada pra ela era uma festa, como se sua espinha profanasse catacumbas no Egito, como se o mundo terminasse em champanhe, dry martini, conhaque ou qualquer tipo de vodka. Para mim o “Speak Low” era a ordem do dia, para ela parecia mais ser algo como a luxuria dos bailes nazistas, com um gosto de Mata Hari na boca, enfim, era eu mais um dos muitos domesticados pelas imagens de Ford, enquanto o cavalo branco de Wayne pastava sem nenhum arranhão em um globo feio, sujo e podre, enquanto ela despia-se da tensão de uma maneira completamente tendenciosa.

É fato que eu estava mais tenso que qualquer gato acuado, dentes rangendo entre dentes, mas não. Não poderia aparentar um sujeito inseguro, pronto para ser confinado em um abate, esperando a hora de ser degustado por gordos, ou crianças famintas. Logo pensaria em me recompor. Não falei nada do caminho do hotel até a avenida cujo nome leva nosso rio. Boca seca, olhar frio preso ao volante. Sim boneca, eu precisava de algo, quebrar o gelo e esquecer por um minuto que estava preso em um carro roubado com uma mulher deslumbrante no assento do lado, de modo que me coloquei a buscar um cigarro e fitar aquelas coxas, que coxas! Desviei-me duas ou três esquinas, veja bem que nem todos coexistem com uma boa memória. Estacionei em um canto escuro, onde alguns metros acima destemidos bebedores acompanhavam uma partida da seleção pelo rádio, embriagando-se de felicidade pelos gols marcados de Vavá, o Brasil sempre foi criativo em apelidar jogadores. As risadas dela cessaram assim que o carro se pos sob a sombra de nossos destinos, onde de fato eu provaria a mim mesmo não ser o “senhor pacato” e teria ao menos uma oportunidade de explicar-lhe meu ponto antes de prosseguirmos. Ao abrir da minha boca as palavras surgiram tão rápidas que um trago bastava para explanar conjecturas políticas no Itamaraty.

- Ouça! Corro o risco de que perca qualquer admiração que tem por meus escritos, qualquer ponto positivo que tenha visto em mim, sobretudo qualquer possibilidade de terminarmos essa noite dançando. Mas tenho que ser sincero e falar-lhe sobre quem sou eu. – Sua face poderia ser a mais bela do mundo, ao seguir dessas palavras minha impressão era de um desconforto clássico. Claro, que idiota faria o que eu fiz. – Você pode ter tido uma impressão mais ácida sobre quem eu sou pela forma como debato sobre um tema querida, mas daí a envolver-me num roubo e achar que tudo esta perfeito é um tanto demais não é?Ela abaixou a cabeça, voltou seus olhos belos para a bolsa e quando de volta retornaram ela acendia um cigarro. Ali eu joguei fora minhas esperanças de terminar a noite bem e satisfeito, tinha provavelmente jogado fora a chance de me envolver com o charme e o que era pior de uma forma completamente rude. Poderia dizer sobre o meu sentimento naquele momento, toda e quaisquer postulação gestual que ela tivesse me dado naqueles poucos segundos entre o cigarro e eu, mas não valeria a tinta, tão pouco o papel, de modo que apoiei-me no volante e fixamente esperei o tapa que levaria, ou ao menos algumas tantas agressões que ela provavelmente tomaria posse.

Felizmente parecia mais entretida no trago de seu cigarro que em minhas palavras. Abriu a porta e com seu típico andar flutuante desceu. E eu? Minha cabeça não parava de perguntar.

- Ora o que diabos deu nessa mulher! – firmei minhas vistas sobre ela e quando dei por respondido ela já estava no bar. Como um cão latindo eu dei mostras da minha ferocidade, de maneira que nada infringiu nela.

-Ei! Espera ai! – Desci o mais rápido que pude e caminhei até o balcão onde ela se recostava. O jogo, o rádio, o bar, jamais teriam uma oportunidade de receber uma figura tão graciosa, todos se calaram, dos dois senhores barrigudos à porta, aos que estavam na mesa de bilhar sem camisa, do português herdeiro de seu balcão, ao velho que desligara o rádio. Em tom baixo para evitar uma cena eu prossegui ate ela dizendo: - Mas o que diabos você veio fazer aqui?

Não tardou sua resposta, esperava ate que tardasse, talvez fosse melhor:

- Comprando um presente pra você querido! O que mais uma mulher como eu poderia fazer em um bar como este não é? – Dizendo aquilo era como se apenas ela existisse no mundo como mulher, em um oceano repleto de homens barbados sujos de graça ou de tinta de banheiros.

- Não precisa me dar nada, só volte pro carro. Isso não é lugar pra você.

Ela sequer me ouviu, virou ao dono da espelunca pediu uma garrafa de uísque vagabunda, duas de conhaque, e uma água ardente que reluzia na prateleira. Estarrecidos, todos ficamos, mas especialmente o português, que imagino eu jamais vira de uma mulher tão jovem uma fome por álcool tão impressa. – São cem Cruzeiros madame. – Ora, vejam só. Ela me pagando uma bebida. Aquilo quebrou-me mais as pernas do que a idéia do presente em si. – Senhora, são cem cruzeiros, vai pagar ou o senhor que vai? – Aquilo me gelou um rim, certamente ficaria sem ele se não resolvesse isso, contudo, a impulsividade dela era notória. Maior do que a de um boxeador.

Retrucou:

- Mas só cem? Acrescente então, por favor, mais quatro maços e cigarros e duas fichas de bilhar.

Como assim duas fichas de bilhar? O que essa mulher queria com isso eu não saberia te dizer, mas sempre os fatos se mostram melhores narradores que eu. Tão pasmo quanto eu estava o bar e seus moradores, era surrealista demais para as mentes atrasadas daquele lugar, até pra mim soava como Mata Hari fazendo jogo duplo para o pentágono. Pedidos atendidos, novo preço estabelecido e uma pergunta no ar. Quem pagaria a conta?

domingo, 11 de janeiro de 2009

Noites de Cabíria (Parte III)

Do estalar das pedrinhas de gelo, ao tic tac do seu isqueiro, não precisava de muito. Olhos negros, olhos negos o que seria de mim sem um par? Pedi imediatamente ao garçom duas taças de seu melhor champagne. Afinal despíamos ali, de todas as manhas perdidas em uma cama sozinha. Despedíamos absolutamente dos boleros de fossa, da emoção deixada em um cinzeiro cheio, entre garrafas vazias para mais um dia de lamentável trabalho. Como era de se esperar ela precisava aquecer a boca, e como proibir o que é inevitável? Como censurar o que de tão absoluto, pede-se a presença. Apanhei dois cigarros ao mesmo tempo. De modo que não me importava, se eram filtros brancos ou vermelhos. Apenas ali estava eu, meu maço e seus lábios. Busquei meu isqueiro, fósforos, ou qualquer pedra que lascada fornecesse fogo. De fato não tinha e êxitei, mas humildemente pedi seu isqueiro, afinal todos aqueles tic e tac’s soavam muito mais do que um puro convite.

- Por favor. Poderia me ceder seu isqueiro? Acabei deixando os meus fósforos em casa. – Claro que minha desculpa não iria ser levada a sério, contudo, pouco importava ali. Queria de fato fumar, os pulmões a todo vapor questionavam a integridade moral do meu corpo.

- O meu? Respondeu ela, de maneira que quando vi, coloquei-me a postular: - Sim os seus, de quem mais?

Ela levantou gentilmente, apanhou os cigarros da minha mão, caminhou elegantemente até o garçom, sorriu. Em uma ode à Afrodite, ou qualquer mulher divinamente fatal os tacos abriam alas à seu carisma. Dos dentes fixos na boca, e uma aparência quase milenar, não se poderia ao menos insinuar uma recusa. Pediu-lhe o isqueiro, que não mais do que poucas notas custariam em qualquer tabacaria respeitável. Acendeu os cigarros e deu-lhe as costas. O garçom num misto de surpresa e gagueira não ousou pedir de volta o artefato. Provavelmente olhará mais o formato da moça do que o que continha em suas mãos. A elegância precede o crime.

Retornou como foi. Elegantemente despida de moral, soterrando qualquer provável fio de misericórdia divina em minha alma, e não seria o que talvez fosse apenas um descuido que acumularia em mim a repulsa à aquela fonte inesgotável de saber feminino.

- Assim está melhor, querido? – Que voz suave. Entonação perfeita, cigarros acesos e gosto de desejo pela boca. Antes que eu pudesse falar mesmo um obrigado, retornou avassaladora entregando-me aquele isqueiro de poucos níqueis: - Pronto! Agora você não pode se queixar de não me fornecer um cigarro.

- Como assim? Esse isqueiro é daquele sujeito, não seria de bom tom sair com ele. Imaginou o escândalo que seria se ele pedir de volta? – Como de fato isso poderia me afetar eu não sabia, mas também não queria provar disso. Tinha uma redação inteira que ouvia de mim pontos sobre a conduta moral política do país. Não seria interessante deixar isso de lado. Contudo me sentia extremamente boçal com aquele sermão de avôs. Mais do que depressa segurou em minhas mãos, e o calor de sua pele certamente descongelaria qualquer padre orando em latim.

- Meu querido, eu não pedi pra ficar com ele. Mas o Garçom também não me pediu de volta. Brindemos, fumemos e caminhemos até meu automóvel. Esse hotel por mais delicado e acolhedor que seja não é capaz de nos fornecer muitos momentos inesquecíveis. Sabes guiar?

Que tipo de garota teria um carro, me pediria para guiar em sã consciência, por mais moderna que fosse? Até então apenas grandes artistas, que estávamos acostumados a ver nas matinês guiavam seus próprios carros, em uma realidade tão distante da nossa, que eu não via absolutamente nenhuma gota de razão naquelas palavras. Obviamente, também não êxitei em dizer sim. Seria mais agradável ir motorizado que caminhando em uma noite com pouca brisa. Aquele encontro realmente, não seria o mesmo de outros memoráveis com garotas de reputação duvidosa, mais tão acolhedora como mães em trabalho de parto. Entretanto, dada a modernidade da situação, os goles de champagne, a ansiedade profunda, e a total face do meu estar, poderia eu vislumbrar um futuro com aquela mulher. – Certo! Vamos ao carro. Há tempos não guio, mas não deve ser nada que nos traga preocupações.

Descemos do bar, caminhamos com a imponência que eu jamais havia provado antes. Passo a passo, de braços dados. Tão preciso quanto o horário de um trem britânico, atravessamos o saguão, até que o manobrista entregasse suas chaves. Ela apontando para mim como se fosse eu o príncipe com sorte, o inglês refinado que jamais partilhou de baixas rodas, da cachaça ardente na garganta seca, indicou quem de fato tomaria as mãos sobre o volante. Mais alguns passos, e lá estava. Completamente solto, entre quatro rodas, que o faziam flutuar. Os tons vermelhos e negros, entre a lataria e o estofado, as linhas circulares e o aro reluzente de suas calotas, a energia que pulsava dos faróis como se a vida fosse apenas uma convenção de Deus para você possuir um demônio sobre rodas, e a absoluta magnitude do contorno do chassi, ardentemente captaram minha memória Hollywood-ana. Sentar-me-ia ali, como o sultão, o magnata do petróleo, o abastado e novamente criaria certamente em minha memória, mais uma velha imitação de Clark Cable. De modo que mesmo tendo todos aqueles sinais de euforia nos pulsos, sentando ao confortabilíssimo acento, indaguei a procedência do veiculo. Como alguma mulher que não pertencesse a alta roda teria um carro como aquele, e por que se era de tão fina estirpe, mandaria uma carta convite, à um fracasso como eu, que longe passava das colunas sociais. A resposta veio crua. Em tom de deboche, sacramentando qualquer duvida sobre a existência de Deus.

- É roubado. Simplesmente era de alguém e agora é meu.
- Roubado? Como roubado? Você está brincando com minha cara não é?
- Não, jamais faria isso com você meu querido.

Impressionante a qualidade de paz de espírito que ela trazia, mesmo sob tais circunstancias. Mesmo que em absoluto furtasse a moral do ar de qualquer coroinha. Não causava sequer um olhar de repulsa, pelo contrario, tais assertivas apenas contribuíam para o espanto geral da nação. Se Getulio ainda fosse vivo, certamente compilaria ali uma lei marcial para todas mulheres do mundo, enquanto Prestes, bom Prestes não faria muito. De modo que coloquei em mim a responsabilidade de lhe enviar à normalidade e realidade das leis de direito.

- Escute querida! Eu não posso dirigir um automóvel furtado! Não é certo. É como casar-se com uma freira. Responda-me como eu poderia guiar para você assim?

- Ora, é simples! É como um carro comum, com a primeira, segunda, terceira e quarta marcha. Você se sairá bem.

Como um tiro certeiro no crânio de um animal. Senti, vi, e ouvi, e devo dizer que apenas por sentir, já me causava um grande alvoroço na espinha.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Noites de Cabíria Part II

"Quando o cigarro declinará da boca, e o teu esboço não surgirá de um talvez."


As versões dos fatos não são abruptas, tão pouco propõe um intenso saber do pisque humanista. Onde os fracos não teriam vez eu me via ponto os sapatos para fora, os cabelos a esquentar idéias e a tosse a cuspir meu coração. A única razão de fato era estar a espera. Primeiro de uma estranha. Depois de uma fábula, um baile, uma invenção, ou seria uma composição? Assim que os demônios chacoalhem meu espírito e brotem à sua imagem e semelhança, estaria eu futuramente a escrever livros e obituários. Nada relevante até aqui.


Tipicamente impessoal é o saguão de um hotel. Olha-se para todos os cantos, e sempre soam como iguais. A imparcialidade dos objetos soltos em paredes foscas como se fossem suspensões que nunca deixaram de estar ali, junto à um carpete felpudo em uma variação de branco. De modo que também não se pode esperar muito dos funcionários. Sempre com sorrisos maliciosos, textos feitos, como uma bossa nova revisitada, inevitável deixar-lhes as moscas. Brincar com o primeiro cão sujo que cruzar à frente, ou afagar crianças de estranhos apenas para sentir um pingo de calor humano. É isso ou o alcoolismo.


Já aproximava-se da hora combinada, quando pousei meus olhos nas escadas, e assim como uma raposa impõe seu feitiço fitaram-me dois pés a descer e embevecer a luz. O longo vermelho planava como uma folha solta no outono, a entrada que somente uma rainha poderia ter. E teria, de modo que movi meu esqueleto sem pestanejar. Os sapatos grunhindo nos meus pés cansados de esperar, e a estranha sensação que valeria cada centavo. Algum dia diria "Que você é como um furacão!". O brilho nos olhos inevitável, o suor frio, entre a imaginação fértil de como seria por baixo de tantos véus. Os rumores apenas tonteavam, argumentavam contra meu córtex. De maneira que me colocava como um jovial velho febril. Ela a musa, e eu o compositor. Entre tantos passos não poderiam caber melhores palavras. ,

Os sapatos vermelhos cintilantes contrastavam com as unhas perfeitamente desenhadas, os olhos negros irrigavam os cabelos lisos negros, e só conseguia imaginar o sabor de seu beijo. Desejo, carnalmente abduzido por um copo de uìsque posto para mim ao balcão. Certamente teria de molhar meu bico para ter forças de encarar a multidão com um ser tão acima de minhas capacidades físicas. Como caminhar no escuro se houvesse luz. Ou fantasiosamente, como voar em pleno mar, com os pulmões cuspindo fogo. De fato os meus estavam. Mas não planejava matar ninguém. Acho que nem mesmo poderia matar alguém, era pacato, tímido, e nada simpático.

O entardecer já havia postulado seu tom à algum tempo, uma brisa árida percorria o saguão, e ela estava totalmente envolta em minha presença. Um drink para completar o inicio do primeiro encontro, em copos distintos tudo pareceria mais tranquilo para mim, de maneira que um trago não poderia cortar mais minha garganta, que já não estivesse cortada, ou o ar completar minhas vias aéreas amais do que já me inundara. Ao bar, onde os ricos sempre completam taças de Martinis, os pobres jamais entram, e os preços arrematam todas as carteiras. Não me importa. Importa é o par de estar com ela. A imparidade só se especifica no singular, e isso já sabemos que ela era. Mesmo que o álcool dragasse meu espírito, e certas pílulas desordenassem minha mente, o Texas ainda seria o Texas, e a Riviera francesa ainda estaria lá. Nada existe a ponto de tontear mais. Nada poderia extirpar alem do que meras convenções de tempo e espaço.

sábado, 13 de dezembro de 2008

Noites de Cabíria (Parte I)



Náuseas, dor de cabeça, litros e litros de água para engolir todas as pílulas. Do calor de suas pernas, ao frio dos tacos de madeira, era seguido por todos os fantasmas da revolução chilena. A ligação entre os formatos das gotas de chuva que caem no pára-brisa do seu automóvel, e a extensa dimensão dos fatos, atribuía a mim o gosto pelo gozo, pelo teu cansaço, Contrane ou Davis, soariam nessas núpcias, enquanto um cinzeiro notável, bravo e áspero arrebataria nossas almas pelos tragos dados. De fato o minuto não seria mais minuto sem sua companhia.

Eu a encontrei, como tantas outras foram encontradas, mas a despi como somente ela poderia ser endeusada, no caminho onde a serpente caminha, nem Adão, nem Eva, conquistam individualmente o paraíso, e por hora nada era mais sensato. Do deslizar de suas alças ao desabotoar do tempo, atribuía novamente eu um absurdo conto de estabilidade. Mas vamos não vamos aos fatos, de factóides os tablóides se viciam e nada teria muita graça.

Era fim de tarde, o rodeio da noite eminente, de maneira a prosseguir com o ar menos denso, e os meus passos decadentes. Paletó risca de giz, chapéu, e sapatos de cromo alemão. Deus sabe que nesses tempos de pós guerra a elegância vem em primeiro lugar. Entre Cowboys e bonecas nazistas, somente minha Rolleiflex poderia fotografar a eternidade. Meu cigarro entre os dedos, a gravata listrada, e uma simples espera. A espera dela, descia do saguão do hotel, sobre scarpins, envolta em panos que mais pareciam a fazer flutuar sobre os demais mortais. As cartas escritas por uma leitora assídua de uma coluna fraca, feita por um colunista não menos fraco, haviam rendido uma grande companhia, e de modo que o fato jornalístico agora era encenado pelo ditador das palavras.
O baile começaria em algumas horas, em tempos difíceis, poucas diversões eram mais aguardadas que ele. Cada minuto de espera era drástico, e a pontualidade tomara meu coração de assalto. "Esperar o que, e de que vale esperar?", perguntas recorrentes de uma mente não sã, com um corpo que em poucos momentos estaria exausto morto sobre uma cama. Um ultimo ajuste na gravata, no caimento do paletó, e ponto, rodeava o saguão esperando a perfeição. Um salto para a eternidade seria a filmografia escolhida a seguir. De barbas e cabelos aparados, eu a vi apodeirar-se de todos os véus, arrebatar-me aos céus, egolir-me como um trago de uísque, e domesticar o psicótico que provavelmente tomaria conta de mim.
Naqueles dias, era moda não se atrasar, dizia-se de bom tom obrigar-se a ser sociável. Talvez pela reconstrução mundial, talvez pela pouca excentricidade do mundo. De modo que pouco ligávamos, se judeus morriam no velho mundo, pouco sabíamos das reais proporções da união mundial. Apenas queríamos ter em John Wayne um herói a seguir. E nas taças de champagne uma determinação para viver.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Filtro Vermelho




São quase cindo da manha, e a iluminação pública é fraca como sempre. A cada esquina se vê um gato vadio, uma encruzilhada para adentrar teu espírito, é fato que isso aqui não anda muito salubre ultimamente. Acordar cedo é tão torturante quanto espetar em baixo das unhas um alfinete, e os cretinos ainda chamam isso de vida, de modo que cá estou eu com as chaves na mão, com meu Marverick roncando enquanto uma vizinha grita algo como uma evocação demoníaca de seu lar, “Que inferno!”, disse ela sem maiores pudores para o horário. Aquilo era de praxe, outro dia ameaçara seu marido com uma escopeta. Sabe-se Deus como ela arranjou aquilo, que tipo de doente mental dormiria com aquele bagulho a ponto de lhe dar dinheiro? Certas perguntas jamais serão respondidas meu caro. Adentro o carro com o conforto que fora proporcionado a mim. Os bancos de couro, a bola oito como minha válvula de vida, a ponto do cigarro já estar queimando, envolto tão em brasa quanto meu coração, de fato minha mulher me aguarda, e é notório que não irei atrasar.

A atração que sinto, é quase como a do câmbio a minhas mãos, tão delirante quanto às mãos dela no câmbio. Esquento meu motor, checo os ponteiros, a gasolina durará ate que a noite toda passe, minhas pistolas no porta luvas, a faca sob o banco, sempre me diriam palavras sobre alguma proteção. No porta malas, ainda existe espaço para corpos junto da escopeta, e das caixas de munição. Por um momento olho-me no espelho, e checo a boa aparência para minha garota, não se pode deixar uma pequena menina dessas escapar. Arranco enfim, e sigo para onde os bêbados não tem mais vez, Rolling Stones no rádio, “Stray Cat Blues” sempre me faz pensar em como é bom corromper menores. As ruas vazias nesse horário são como uma licença temporária para matar, correr, e burlar a lei, de fato nenhum guarda seria avistado nas próximas duas horas, e era ainda pior durante a madrugada anterior. Aqui apenas se vê mais do mesmo, o de sempre, a inundação de seres bizarros e cafetinas voltando para suas casas. A abertura de padarias, e entregadores de jornais ainda nem apontam seus focinhos fora de casa.

O caminho tortuoso, cheio de sete curvas, inclinado e indelicado. O odor dos arredores do centro nada agradável, de modo que não seria nenhum absurdo despertar irritado. O rio por onde sempre passo, fétido, cheio de más impressões, mas quem liga? Certamente não eu, conforto do meu carro, partindo para o nove entre o dez e o oito, preparado pra dar no pé daqui e seguir até onde houver o ultimo posto de gasolina solitário. O cigarro acesso, serve pra me manter mais perto do calor da boca dela, e isso realmente me traz boa sorte. Já passam das cinco da manhã, e penso na droga que seria atrasar-me a um encontro tão interessante, na verdade seria um pecado não iniciar meus dias com o balbuciar dos lábios dela, com a cerveja verde gelada aliviando o clima da garganta, matando minha saudade com o veludo da saudade dela. Certamente iria pro céu pelo clima, e para o inferno pelas companhias, entretanto, aonde eu for ela estará. Que seja com uma pistola sobre as coxas, ou um rifle encarando nossa danação.

Trinta minutos de carro e cá estou, aguardando por ela, embaixo de seu prédio. Ligo no seu telefone, e ouço mais uma vez aquela voz, e lembro de pensar “Demônio, quase dá pra sentir seus dentes roendo meus ossos”. Desço do carro, desligo o rádio, deixo o seu rock and roll penetrar afiado como um sabre, que corte meu pescoço então. Qualquer definição de ansiedade para ver novamente aquela pele branca, olhos negros e lábios vermelhos conseguiria ser totalmente abstrata, absolutamente inadequada, e obscura como caminha a pé sobre as águas. E pensar que um único parto gerou aquela mulher! Sim seria mais fácil imaginar uma equipe médica montando seu corpo com extrema exatidão cirúrgica, do que apenas um conjunto de junções genéticas. Absolutamente a hipnose filtraria meu sangue vermelho, e se acolheria no braço de minha amarração como a cocaína às novas gerações, tal qual o ópio à Coréia e a bebida aos nossos corações.